Tudo o que dás, será para sempre teu.
Se hoje se diz que as novas gerações não conhecem o sabor fresco e o espírito irreverente da liberdade e da democracia, o mais recente turno da Colónia de Férias da Cáritas Diocesana de Leiria veio provar o contrário. No contexto do imaginário que acompanha as crianças ao longo do turno, desafiámo-las a deitarem abaixo a ditadura em que foram recebidas. A revolução ganhou forma nos últimos dias e não podia ter sido um maior sucesso!
Mas nem só o imaginário foi uma novidade. A verdadeira inovação consistiu na realização de um turno pré-juvenil, exclusivamente com crianças dos 10 aos 12 anos, nesta primeira quinzena de Agosto. Trata-se, sem dúvida, de uma faixa etária especial, marcada pelas mudanças próprias do início da adolescência. A par deste turno, a Casa Amarela, na praia do Pedrógão, recebe ainda este verão dois turnos infantis e um turno juvenil, num total de quase 300 crianças e adolescentes.
Há muito que esta colónia de férias é um exemplo singular de amor não só à casa como também à causa, onde o voluntariado se materializa numa aprendizagem que alia a capacidade de trabalho à inteligência emocional de criar um laço com cada criança. São laços que se estabelecem durante dez dias, com a força necessária para aprendermos com a vivacidade e sinceridade das crianças, por um lado, e para que as possamos inspirar, por outro, num sentido de construção de futuro. “Tudo o que dás será para sempre teu” – é com verdadeiro espírito amador que, enquanto monitores, damos o que podemos e sabemos dar, e essa entrega marca-nos indelevelmente, a nós e às crianças, num misto de egoísmo e altruísmo. Esta é uma experiência rara, que sabemos só ser possível porque as crianças vivem a colónia de férias de mãos, coração e mente aberta, o que resulta numa oportunidade irrepetível de lançar a semente em terreno fértil. É com a expectativa criada pelas doces recordações que, findo um turno na Casa Amarela, pensamos se haverá a água e o sol que façam a semente germinar.
Temos assim uma dupla missão, a de multiplicar os afetos e a de inspirar para o futuro, conciliando o humanismo com a pedagogia, sem que tenhamos a falsa pretensão de reeducar ou mudar a realidade de cada criança, mas sim de transformar o seu olhar sobre ela. É uma missão tão gratificante quanto desafiante, pela singularidade das crianças e das suas histórias, que lhes permite escrever uma nova história, da qual são protagonistas, e em que a praia, o pinhal e o imaginário por nós construído são apenas o cenário. Estamos certos de que quem faz a colónia são as crianças!
Foi por tudo isto que o turno que terminou no passado dia 13 de Agosto culminou numa revolução – as crianças conheceram uma versão adaptada de regime ditatorial, que fez crescer a vontade de reconquistar os seus direitos e lutar por eleições democráticas, numa história que protagonizaram lado a lado com os seus monitores, pautada por peripécias e muitas surpresas. Infiltrar a polícia do regime, trocar mensagens codificadas, descobrir impostores e entoar secretamente hinos de liberdade são apenas alguns exemplos do caminho da revolução que fizeram. Assim como esta história foi concebida à medida das crianças, também as actividades o foram, dos peddy-papers aos jogos de praia, porque “eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura”.
Prepara-se agora um novo turno. Só podemos esperar continuar a desenhar sorrisos e a povoar o imaginário das crianças, sempre atentos àquilo de que precisam. É um privilégio ser voluntário na Colónia de Férias da Cáritas Diocesana de Leiria, fazermo-nos sentir junto das crianças, da mesma forma que elas nos cativam, quais Principezinhos, e deixam em nós a sua marca humanidade.
Sandra Duque Maurício
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